terça-feira, 26 de junho de 2012

Da Fonte da Pipa à Arialva, passando pelo Olho de Boi (3/3)

Continuação de:

Quinta do Olho de Boi


A Quinta do Olho de Boi ou do Palliart foi edificada por Luís Francisco Palliart em terrenos junto à Fonte da Pipa que lhe foram aforados pelo Convento de S. Paulo em 1730 (ADS-CNA, Cx. 4415, L.213, fól. 23f), aforamento renovado em 1838 pela Fazenda Nacional a António Palliart, quando esta propriedade se compunha de «quinta, casas, e armazéns, e baldio à borda da praia entre a Fonte da Pipa e Arealva» (ADS-CNA, Cx. 4415, L.213, fól. 23f).
Já em 1630 fora aforada pela CMA a Hierónimo Dosem, morador na cidade de Lisboa, uma propriedade à Fonte da Pipa onde estava «hu pedaço de chão junto à rocha que vai para o Olho de Boi o qual não era de nenhua utilidade ao concelho» para nele fazer «benfeitorias no prazo e hu ano», não sabemos contudo se esta escritura teve consequência.
Esta propriedade já existia como fazenda em 1738 pois nesse ano Arcibal Arthur (morador em Cacilhas, e homem de negócios inglês) contrata com JOÃO BAPTISTA, mestre pedreiro (o mesmo da Ermida de S. Sebastião), para este lhe fazer um armazém no sítio da Fonte da Pipa, junto à fazenda de Francisco Luís Paliart (idem, idem, L. 86-I, f. 101).


Quinta da Arialva


A Quinta da Arialva terá sido edificada nos terrenos onde esteve um Forno de cozer telha e tijolo dito «Forno da Arealva» que em 1709 foi aforado pela CMA a António Dias Pinheiro (vd. AHMA-CMA-SA-NP, L. 03 (N.1800), fól. 20v).


Foi nesta propriedade que, em 1757 (*), João O’Neill, nobre irlandês católico e exilado, se estabeleceu com um negócio de produção e armazenamento de vinhos como mais tarde regista José Baretti na sua visita a Almada em 1760:
«(…) do hospital inglez, donde voltei, rio acima, para casa de um irlandez que negoceia em vinhos por grosso, esperando induzil-o, com dinheiro ou com boas palavras, a dar-me algum por miúdo, tendo com effeito tanta necessidade d'elle como os meus catraeiros. E foi uma felicidade que aquelle senhor negociante de vinhos, que se chama ONeal usasse para commigo de tanta cortezia (…) o qual apenas quiz consentir que eu depenicasse um cacho das suas vinhas, que todavia estavam carregadissimas d'elles. Deu-me com liberalidade o sr. O'Neal a beber quanto eu quiz, e fez-me provar mais qualidades de vinhos muito estimados, e aos meus suados barqueiros deu também um garrafão, pondo ainda difficuldade em deixar metter algum dinheiro no bolso de um seu pequeno. Aquelle cavalheiro tem a sua casa protegida do rio por uma espécie de molhe construido de grossos penedos».
(Vd. José Baretti et Alberto Telles (trad. ital.), Portugal em 1760. Cartas Familiares (XV a XXXVIII) de José Baretti, Lisboa : Typ. Barata & Sanches, 1896, pp. 35-40 – Cit. Abrantes Raposo et Victor Aparício, Os Palmeiros e os Gafos de Cacilhas, Cailhas : J.F., pág. 57).


     (Quinta da Arialva)

O negócio dos vinhos trouxe alguma prosperidade a O’Neill que em 1766 diz numa petição ao Patriarca de Lisboa que «em muitas oucaziões sendo isso cauza os maus caminhos, e refluxos do mar, se lhe dificulta o poder hir às igrejas da ditta villa (de Almada) satisfazer o preceyto da Missa, tendo hua grande família de mulheres, e crianças menores, motivo este por que nas cazas nobres, que proximamente fez para sua habitação (na fazenda da Arialva) mandou fabricar hua Irmida com porta para o largo da mesma fazenda com comodidade sufficiente para que não só a sua família, mas também os estranhos possão nella ouvir missa» (TT-CEL, Mç. 1809, n.º 172). Esta ermida era a Capela dedicada a S. João Baptista de que ainda restam vestígios.
 (Portal da Capela de S. João da Arialva)

A quinta foi comprada já no séc. XIX por João Luís Lourenço passando depois aos seus herdeiros, Domingos Afonso e mulher.

RUI M. MENDES
Caparica, 25 de Junho de 2012

Revisão em 12 de Fevereiro de 2013
(*) Algumas fontes indicavam que João O'Neill se havia estabelecido na Arialva em 1740, contudo elementos compilados por Pedro O'Neill Teixeira permitem registar 1757 como o ano em que aquele adquiriu esta propriedade, tendo aqui falecido a sua sogra no fim desse ano (vd. Teixeira, Pedro O'Neill. Amigos da Dinamarca, p. 402).

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